RIO - A promotora de eventos Iris Ribeiro, que trabalhava há dez anos no Edifício Liberdade, que desabou na quarta-feira, revelou na segunda-feira que o alojamento de um antigo zelador, no 20º andar, era usado como depósito de entulho de obras desde o ano passado, quando o cômodo foi desocupado pela família do ex-funcionário, após a sua morte. Iris, que estava atualmente na CM&O Turismo, no 14º andar, mas já trabalhou para a Smart Solution, hoje rebatizada como TO Tecnologia Organizacional, afirmou que, como era hábito no prédio subir com o entulho para o local e estocá-lo ali até a remoção, os restos da obra do nono andar, iniciadas pela TO 13 dias antes da tragédia, também seguiram para o alojamento.
— Estava tudo lá — disse ela ao GLOBO.
O empresário Sérgio Alves de Oliveira, sócio da TO, garantiu, porém, que o entulho foi removido antes do desabamento e levado em caçambas pela firma Catalão. Sérgio mudou na segunda-feira a sua versão sobre a obra do nono andar. Ele disse que ela não começou oito dias antes da tragédia, e sim 13 dias antes, e admitiu a derrubada de seis paredes de tijolos, incluindo agora o desmonte de uma sala, e não apenas de dois banheiros do andar.
Iris explicou que o alojamento era vizinho à casa ocupada pelo zelador Cornélio Ribeiro Lopes, que morreu com a mulher, Margarida, no desabamento. Ela disse que o lugar virou depósito de entulho depois que o síndico do prédio, Paulo Renha, pediu à família do antigo zelador Josenilton que deixasse o imóvel.
O empresário da TO disse ao GLOBO que, na noite da tragédia, os operários contratados para a reforma no andar subiam com 350 tijolos, seis sacos de cimento de 50 quilos, dois metros cúbicos de areia e 40 quilos de gesso. Somados, os produtos pesavam cerca de 2,7 toneladas, mas Sérgio disse que, até o desabamento, apenas 30% teriam subido:
— O material só começou a ser carregado às 20h, depois da liberação do elevador.
A informação é contestada pela advogada Michele Silva Leite, que tinha um escritório no prédio. Ela garantiu que, pouco depois das 18h, quando deixou o Liberdade, os operários já haviam começado a subir com o material. Sérgio Alves, da TO, disse que a reforma incluiu a retirada de cerca de 15 cm do piso do andar.
Número de andares passou de 15 a 18
O secretário municipal de Urbanismo, Sérgio Dias, explicou na segunda-feira que a análise das licenças não identificou irregularidades em relação ao projeto aprovado em 1939 pela então prefeitura do Distrito Federal. A última grande intervenção no prédio que dependeu de licença foi a extensão, em 1950, da área construída. Os três últimos pavimentos passaram a avançar até a fachada do imóvel (antes eles tinham um recuo). Na década passada, há registro de um pedido de abertura de uma janela do 18 andar, em que a comissão do Corredor Cultural do Centro foi consultada e deu o "nada a opor". Mas, de acordo com o secretário, a licença era dispensável.
A licença para obras foi solicitada por Manoel Lourenço Renha, pai do atual síndico. Em 1938, ele apresentou um projeto propondo reconstruir um prédio de três andares, mas a prefeitura indeferiu o pedido porque a construção não obedecia ao recuo da Avenida Treze de Maio. Manoel apresentou então um projeto propondo inicialmente que o prédio tivesse 15 pavimentos, além de lojas no térreo, que foi aprovado. Até o oitavo andar, eram pavimentos corridos. Do 9º ao 15º andares, o projeto previa a construção de quatro salas por pavimento. No terraço, estavam projetadas mais duas salas.
A licença foi concedida em 14 de julho de 1938. Mas, em fevereiro de 1939, o então proprietário propôs mudanças no projeto com o padrão atual. A nova licença saiu em 24 de março de 1939: o prédio ganhou um subsolo, além de mais três pavimentos com salas. O habite-se foi concedido em 5 de setembro de 1940:
— A prefeitura tratou de analisar se o projeto e as mudanças atendiam à legislação vigente. E atendiam. Cabe ao engenheiro responsável pelas obras avaliar a estrutura do prédio — ressaltou Sérgio Dias.
Ontem, no inquérito que apura as causas do desabamento, o delegado da 5ª DP, Alcides Alves, ouviu Vitor Nogueira, sócio de uma empresa que funcionava no 8º andar do Liberdade. Segundo o advogado dele, Edil Murilo, foram entregues ao delegado fotos do escritório mostrando que a construção original tinha mãos francesas como reforço da estrutura. O delegado agora quer saber se havia mãos francesas em todos os andares.
Vitor contou ainda que, na noite anterior à tragédia, por volta das 19h30m, ouviu um forte barulho vindo do 9º andar. E que chegou a interromper a reunião que fazia com oito funcionários. Segundo Edil Murilo, parecia o estrondo de uma máquina na parede ou no chão.
Na segunda-feira, o conselheiro do Tribunal de Contas do Município, Nestor Rocha, lembrou que, quando foi vereador, aprovou um projeto de sua autoria nos anos 90 que previa vistorias anuais em prédios com mais de cinco anos de construção. Os laudos ficariam arquivados na prefeitura como forma de prevenção de acidentes. A lei foi promulgada, mas depois julgada inconstitucional.
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